sábado, 15 de julho de 2017

Across the Universe: O retrato de uma geração


Across the Universe é o retrato de uma geração ao som dos The Beatles. Essa é a melhor definição para o filme. Com músicas dos Beatles o filme conta a trajetória de um grupo de jovens nas décadas de 60 e 70 nos EUA. Com erros e acertos a diretora Julie Taymor nos narra uma história que de maneira lúdica retrata a vida dos jovens daquela época.

Cheio de referências as obras dos Beatles, com personagens chamados Jude (da canção Hey Jude), Lucy (da canção Lucy in the Sky with Diamonds) e Prudence (da canção Dear Prudence), e de ícones da época como Janis Joplin e Jimi Hendrix, o filme narra a história de Jude (Jim Sturgess), um jovem de Liverpool, que vai para os EUA em busca do pai que abandonou a mãe quando ela ainda estava grávida. Lá ele conhece Max (Joe anderson) de quem se torna o melhor amigo e parceiro. Depois de um jantar complicado na casa de Max, eles vão para Nova York e passam a morar com Sadie (Dana Fuchs) uma jovem cantora, referência clara a Jannis Joplin, que abriga novos artistas, entre eles o guitarrista Jojo (Martin Luther McCoy), uma referência clara a Jimi Hendrix, e Prudence (T. V. Carpio), uma garota perdida que depois de se apaixonar por uma colega de escola vai para Nova York em busca de um novo rumo na vida. Logo se junta a eles Lucy (Evan Rachel Woods), irmã de Max que acabou de perder o namorado na Guerra do Vietnã, e por quem Jude já era apaixonado antes, e não demora muito para que os dois engatem um romance. Tendo o romance de Jude e Lucy como viés principal da narrativa, o filme conta a história desses jovens em meio aos movimentos civis americanos, mostrando seus medos, lutas, dificuldades, erros e acertos.

O filme tem seus erros e acertos. Um dos acertos principais é o uso de um elenco de praticamente desconhecidos, com exceção de Evan Rachel Wood, que nem tão conhecida do grande público ela é, o elenco é composto de jovens atores em começo de carreira. Dessa forma fica mais fácil você acreditar nos personagens e nos seus ideais e nos seus problemas, e quando cantam não pensamos que estamos vendo o ator tal cantando a tal música conhecida, como ocorre em Mamma Mia! por exemplo, acreditamos que realmente é aquilo que estão sentindo naquele momento que a música reflete mesmo seu estado de espírito. Como por exemplo quando ouvimos Let it be realmente sentimos a dor de quem a canta, ou quando ouvimos a canção If I feel dá pra sentir os medos e incertezas de Lucy com respeito Jude, na verdade a música caiu como uma luva para aquele momento. E mesmo quando ouvimos canções como Dear Prudence e Hey Jude, que estão ali unica e exclusivamente para justificar o nome dos personagens, elas funcionam, se fosse um elenco conhecido talvez não funcionasse.


Outro acerto foi fazer novas roupagens das músicas. Let it Be se tornou um soul, Come Together se tornou um blues, Hold Me Tight se tornou um rock meio progressivo na inglaterra e um rock estilo anos 50 nas cenas nos Estados Unidos, I've Just a Face ficou com uma levada country pop, entre outras. Isso facilita para que não pensemos nas músicas apenas como uma música de sucesso dos Beatlles mas como parte da história e do roteiro. Mas se as novas roupagens são um acerto, o diretor e os roteiristas erraram no excesso de músicas utilizadas. Existem momentos do filmes que vemos duas, três músicas serem executadas em seguida quase sem nexo uma com a outra. Esse excesso incomoda um pouco e torna o filme um tanto cansativo em certos momentos, quando por exemplo é retratado a fase psicodélica dos Beatles.

O excesso inclusive nesse ponto do filme é incômodo, o excesso de cores para destacar esse período dos Beatles, e também o uso de drogas em excesso e os excessos dos jovens naquele período é excessivo demais, e é cansativo e cansa a visão e os ouvidos também. Eu tiraria com certeza a sequência de Being for the Benefit of Mr. Kite que leva o nada ao lugar nenhum para incluir a versão de And I Love Her que foi deletada, e você pode conferir nos extras do DVD. Excessos esses que impediram de se aprofundar em outros personagens interessantes como é o caso de Prudence, parece que a personagem simplesmente tá ali pra poder colocar a música no filme, não sabemos nada dela, nem de seu passado, nem o que ela fez quando esteve sumida, e como ela resolveu os seus problemas, suas indecisões.

Algo também que incomoda no filme é a mixagem do som. Como se sabe um musical precisa ter a mixagem muito bem feita, pra juntar músicas, diálogos e sons diegéticos do ambiente. Mas no caso aqui o mixador não fez um trabalho 100%, em dados momentos fica difícil acompanhar a música e os diálogos, e diferenciá-los. Se a mixagem não foi 100%, a fotografia é incrível. A forma como ela foi usada é magnífica. Foi usado na Inglaterra uma fotografia fria, opaca, que demonstra bem a situação pessimista dos ingleses do pós-guerra, que só querem saber de trabalhar, ganhar seu dinheiro, ir ao bar, casar e ter filhos. Quando somos levados aos EUA a fotografia é composta de cores quentes e muito colorido que destaca bem o american dream life.


Ainda falando desse ponto, algo que alguns reclamam do filme, e que sinceramente eu também no começo pensei assim, é o fato de o filme não ter apenas números musicais pé no chão ou números musicais estilizados. O fato é que o filme começa com musicais pé no chão, que vai se estilizando chegando ao auge da estilização no momento Being for the Benefit of Mr. Kite e depois vai se desistilizando e chegando a um último número bem pé no chão que remete ao show que os Beatles fizeram no terraço da Gravadora Apple em Londres, quando a polícia impediu eles de tocar, o mesmo acontece aqui. Isso me incomodou quando a estilização começou a aparecer. Pensei comigo: "porque não fizeram apenas um tipo de números musicais". Conforme o filme foi passando entendi o motivo disso. Ao fazer isso a diretora quis fazer um retrato da situação dos jovens na época e também do estado de espírito, psicológico e emocional dos personagens. Afinal de contas Across The Universe é um retrato de uma geração. E a diretora faz esse retrato através dos números musicais, quando o filme começa os jovens estão levando uma vida dentro da normalidade, estão bem psicologicamente e emocionalmente normais, resultado números pés no chão o que mais se aproxima de uma estilização é I've Just Seen A Face que retrata bem o momentos de alegria de Jude. Mas conforme vai passando o tempo e a guerra chega ao seu auge, eles começam a se engajar em lutas civis, a loucura vai tomando conta deles, o uso de drogas indiscriminadamente junto com os problemas sociais e civis nos EUA na época os deixam "loucos", e psicologicamente perturbados e isso é retratado pelos números musicais, que chega ao auge da loucura na estilização do número musical de Being for the Benefit of Mr. Kite, ali eles estão no auge da alegria, mas regada a muitas drogas e loucura. Após esse momento de loucura vemos todos eles depois deitados no chão, no capim delirando, que é sucedido pelo número de Because, também estilizado mas menos louco mais clean, é como se as coisas estivessem loucas, mas a euforia das drogas vai se dissipando e eles tem de voltar a realidade, evidenciando pelo momento em que Max põe a cabeça pra fora da água. Depois os números vão se intercalando em estilizados e pé no chão. Que vai intercalando os momentos de agitação e tranquilidade, de problemas e soluções, de alegria e tristeza. E conforme vai passando o tempo e as coisas vão se acalmando os movimentos civis passam a entrar no período de Paz e Amor, outros caem no pessimismo do momento e a vida vai voltando a normalidade os números se tornam mais pé nos chão, mais reais e até melancólicos, chegando ao número final que é a apresentação de uma banda no alto de um prédio. Esse talvez pra mim foi o maior acerto do filme, a montagem dos números musicais que começa realista vai para a loucura daquelas décadas, e vai voltando a normalidade depois do auge das loucuras, a forma como demonstra o estado de espírito dos personagens, talvez seja seu maior acerto.

Com erros e acertos Julie Taymor nos entrega um musical divertido e interessante, que me deixou uma sensação de satisfação ao fim do filme. Certa vez Heitor Valadão no Podcast "Os Novos Musicais" do site Cinema em Cena disse, 'você avalia a qualidade de um musical se depois do filme você sai cantarolando algumas das músicas que foi apresentadas e se algum número musical ficou em sua cabeça'. Bem ao final do filme não consegui parar de cantar as músicas dos Bettles, e até o momento as músicas deles estão ainda na minha cabeça, e tem pelos menos três números que ainda estão na minha mente. Então com os erros e acertos Acrosss The Universe cumpre seu papel de divertir e prestar um tributo aos Beatlles, retratar suas fases, fazer uma homenagem a ícones da década de 60 e 70 e fazer um retrato de uma geração como aquela, sonhadora, louca, que só queria uma coisa mostrar pra todos que o que todos precisam é de amor!


Obs: Não posso ver um filme com música dos Beatles, escrever um texto sobre esse filme e não deixar de lembrar e citar meu amigo Tullio Dias, do site Cinema de Buteco. E Tullio concordo contigo, algumas músicas dos Beatles são bem melhores em outras versões e nas vozes de outros.

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